Assédio moral: o bullying das empresas
Por Simão Vieira, www.administradores.com.br
Ultimamente, têm ganhado espaço nos noticiários denúncias e discussões sobre atitudes agressivas de crianças e adolescentes contra colegas, o chamado bullying. A prática consiste na depreciação, constrangimento ou humilhação de meninos e meninas através de violência física ou psicológica praticada por outros da mesma faixa etária, e está chamando a atenção das autoridades e da sociedade, que têm se mobilizado em campanhas nos meios de comunicação e nas escolas.
Nas empresas, outro tipo de agressão, muito parecido com o bullying, de forma silenciosa, tem causado danos graves a profissionais e, até, destruído carreiras. No livro Chefias Avassaladoras, que dá o título desta matéria, o autor Jorge Dias Souza trata desse delicado tema: o assédio moral. Para entender melhor o assunto, esse fantasma que tanto assombra o mercado de trabalho, o Portal Administradores ouviu o escritor e a advogada trabalhista Ingrid Brabes, que esclarecem a questão para você, internauta.
O que é assédio moral? Segundo Jorge Dias Souza, “é a exposição do trabalhador, pelo seu chefe, a situações humilhantes e constrangedoras, de forma continuada, durante sua jornada de trabalho”. Ele destaca que este é o tipo de assédio que pode ser classificado como vertical descendente, dado de um superior sobre um subordinado, e lembra que a prática pode acontecer de modo horizontal, ou seja, entre colegas de um mesmo nível hierárquico.
Do ponto de vista legal, a Constituição brasileira não é clara quanto ao assunto, segundo a advogada Ingrid Brabes. “Em termos de legislação federal, aqui no Brasil não existem leis que definam expressamente o conceito de assédio moral. Assim, os juízes têm se valido de princípios constitucionais, principalmente, da dignidade da pessoa humana, além de utilizar conceitos de responsabilidade civil existentes no Código Civil para condenar o autor do assédio moral ao pagamento de indenização ou de obrigação de fazer”, explica Brabes. A advogada lembra, no entanto, que legislações municipais e estaduais já tratam do assunto, como a Lei 13.288/01, do município de São Paulo:
Todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à estabilidade do vínculo empregatício do funcionário, tais como: marcar tarefas com prazos impossíveis; passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um funcionário só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços.
“Crises de choro, dores generalizadas, insônia, irritabilidade excessiva, tonturas, alcoolismo”. Estas são algumas das conseqüências do assédio moral para muitos dos profissionais assediados, como relata Ingrid Brabes. No ano passado, uma série de suicídios cometidos por funcionários da France Telecom, no período em que a empresa passava por um processo de reestruturação, chamou a atenção para a pressão no ambiente de trabalho, e entidades representativas chegaram a culpar os diretores da organização, acusando-os de não terem capacidade de lidar com a situação.
Para as empresas, os prejuízos começam pela queda na produtividade. “Os principais impactos do assédio moral são a eliminação total do comprometimento, da criatividade, da inovação, da motivação e da felicidade do funcionário”, afirma Jorge Dias Souza, que complementa: “a produtividade pode ser afetada à medida que o funcionário passa a sentir-se um inútil e, dominado pelo terrorismo psicológico e pelo pânico na relação com o chefe, vai errar muito no trabalho que faz, pois não se sente mais capaz de realizar nada”. Souza lembra ainda dos prejuízos à imagem da organização, que o assédio moral pode causar: “ninguém na sociedade (os clientes ou futuros clientes) aceita mais transacionar com uma empresa que permite a prática do assédio moral com seus colaboradores”, afirma.
“Muitas vezes, infelizmente tenho de dizer isto, é preferível demitir um empregado que não esteja alcançando os objetivos da empresa a prolongar uma relação, sob constantes constrangimentos, para se conseguir determinada meta”, afirma Ingrid Brabes.
Como identificar o assédio moralIdentificar uma prática como assédio moral nem sempre é fácil. Por isso, antes de levar o assunto para o setor responsável da empresa ou mesmo a instâncias judiciais, é importante ficar atento a algumas características. “Perseguição, manipulação, terrorismo psicológico, exposição continuada ao ridículo”, são alguns fatores citados por Ingrid Brabes. A advogada lembra ainda que a continuidade da prática é determinante para sua tipificação como assédio moral. “O assediador pretende desestabilizar emocionalmente a vítima, por isto age de maneira continuada”, afirma Brabes.
A advogada elenca algumas atitudes praticadas nos ambientes de trabalho e que podem caracterizar o assédio moral:
– Xingamentos diários a secretárias;
– Insultos de superiores praticados durante a jornada de trabalho;
– Ofensas de forma repetida na frente dos demais colegas;
– Utilização de adornos que expõem ao ridículo em caso de não cumprimento de metas por vendedores;
– Isolamento de pessoas que retornaram de afastamentos;
– Tarefas degradantes e abaixo do real cargo ocupado pelo empregado (por exemplo: engenheiro sendo obrigado a limpar banheiro ou servir cafezinho como forma de punição);
– Difamações;
– Boicote de serviços e material;
– Frases depreciativas.
Resolvendo o problemaUm conselho dado por Jorge Dias Souza é que o assediado procure reunir o máximo de provas possíveis, antes de denunciar o assédio. “Coisas como bilhetes, e-mails, trabalhos rabiscados e rasurados agressivamente pelo chefe”, explica o autor de Chefias Avassaladoras.
Para as empresas, o melhor caminho é manter uma espécie de ouvidoria interna, através da qual vai procurar sanar problemas como o assédio moral sem necessidade de ir à Justiça. No entanto, infelizmente, segundo Ingrid Brabes, poucas empresas têm setores estruturados com este fim. “Se estivermos tratando de empresas grandes, normalmente existem serviços de ouvidoria interna que costumam ser imparciais e tendem a investigar e solucionar o problema. Contudo, tenho de admitir que referidas empresas e ou serviços são minoria em nosso país”.